Partindo de uma situação de quase ruptura, com o aterro esgotado e vendo-se forçada a enviar os seus resíduos para diversos pontos do país, a AMTRES decidiu olhar de frente para o problema e avançar com um plano de gestão de resíduos pioneiro em Portugal, apostando essencialmente na valorização orgânica e na reciclagem e relegando para segundo plano soluções de fim de linha, como a incineração e o aterro. Para poder avançar com o seu plano foi necessário que os quatro municípios (Cascais, Mafra, Oeiras e Sintra) se entendessem quanto à solução a adoptar, o que permitiu afastar desde logo a possibilidade da AMTRES instalar uma unidade de incineração.
Com base no plano apresentado pela Tratolixo, foi assim decidido aproveitar ao máximo a capacidade da estação de tratamento mecânico e biológico já existente em Trajouce e criar condições para que todos os resíduos provenientes da recolha indiferenciada sofram um pré-tratamento. Desse pré-tratamento resultam três fracções: matéria orgânica estabilizada, materiais recicláveis e rejeitados.
A matéria orgânica estabilizada nesta fase ainda poderá ter um destino agrícola, mas devido ao seu teor em metais pesados deverá gradualmente ser encaminhada para outro tipo de utilizações que não impliquem a entrada na cadeia alimentar, tais como jardins e espaços verdes, viveiros florestais ou recuperação de solos degradados na sequência de obras de construção civil, entre outras. A matéria orgânica é indesejável na incineração devido ao seu elevado teor em água que reduz a produção de energia, enquanto que no aterro origina poluição da água, libertação de odores e emissão de gás metano para a atmosfera contribuindo para o efeito de estufa.
Mais reciclagem
Por seu lado, os recicláveis resultantes da triagem de resíduos em bruto podem ser encaminhados para a Sociedade Ponto Verde (SPV), nomeadamente alumínios, metais ferrosos, plástico, vidro, cartão e pilhas. Este processo de triagem permite ainda o aproveitamento de plásticos mistos ou sujos que de outra forma iriam parar ao aterro ou à incineração, constituindo um peso ambiental e financeiro. Para o efeito, a AMTRES previu a instalação de uma unidade de reciclagem dedicada a estes plásticos que poderá receber muitas das embalagens de plástico que actualmente não são aceites pela SPV.
Parte dos rejeitados do tratamento mecânico e biológico vai ser encaminhada para o aterro de resíduos inertes que vai ser instalado em Mafra. Aí, devido à quase ausência de matéria orgânica fermentável, esses resíduos darão origem a quantidades muito reduzidas de gases e lixiviados, sendo uma opção segura em termos ambientais, ao contrário dos aterros normais que recebem grandes quantidades de resíduos orgânicos.
Os restantes rejeitados serão encaminhados para incineração na Valorsul, aproveitando a capacidade excedentária daquela unidade.
Esta opção faz todo o sentido se tivermos em consideração que os rejeitados de uma estação de tratamento mecânico e biológico possuem o dobro do valor energético (PCI = 15 MJ/kg) do que os resíduos em bruto que actualmente são incinerados na Valorsul (PCI = 7,5 MJ/kg).
Para além da optimização da unidade de tratamento mecânico e biológico de Trajouce e da construção do aterro de resíduos inertes em Mafra, a AMTRES irá instalar uma unidade de digestão anaeróbica também em Mafra. Nesta unidade serão tratados e transformados em biogás (energia renovável) e composto, parte dos resíduos orgânicos triados em Trajouce, os quais serão gradualmente substituídos pelos resíduos orgânicos provenientes da recolha selectiva de forma a ser produzido um composto de qualidade superior.
Reforço da recolha porta-a-porta
Descritas que estão as infra-estruturas que constituem a base do sistema da AMTRES, há que referir a forma como esta entidade se propõe aumentar as taxas de recolha selectiva. Nesse sentido será feita uma forte aposta no melhoramento da recolha porta-a-porta nos grandes produtores (restaurantes, comércio, escritórios, estabelecimentos de ensino, hospitais, mercados e outros) de forma a rapidamente se aumentarem as taxas de recolha selectiva de recicláveis e de matéria orgânica. Simultaneamente será lançado um programa de melhoramento da recolha selectiva junto dos produtores domésticos com especial destaque para a recolha porta-a-porta. Este programa será acompanhado por diversas acções de sensibilização da população.
Globalmente pode concluir-se que o plano da AMTRES aproveita bem as infra-estruturas existentes (em Trajouce e na Valorsul), lança novas infra-estruturas com garantias de segurança ambiental (aterro de inertes e central de digestão anaeróbica em Mafra) e aposta decididamente nas novas tecnologias de reciclagem, como é o caso dos plásticos mistos, e nos processos mais eficientes de recolha selectiva, como é o caso da recolha porta-a-porta.
Engº. Rui Berkemeier Centro de Informação de Resíduos da Quercus QUERCUS Ambiente nº. 13 (Março/Abril de 2005)